26/02/2018

CRISTINA BACELAR | Discurso Direto


"Nem Tudo é Fado" é o novo trabalho a solo de Cristina Bacelar. O fado é aqui revisitado de forma original e arrojada, pincelado com os tons coloridos da bossa nova e do jazz, num cruzamento entre guitarra flamenca, guitarra portuguesa, percussões e saxofone. Primeiro estranha-se, depois entranha-se”... e convence!

Portugal Rebelde - Este disco é uma viagem pelo fado e pelo flamenco?

Cristina Bacelar - Este disco é uma fusão entre o fado, o flamenco, o jazz e a balada, tem uma sonoridade muito própria, uma assinatura muito pessoal, uma leitura do fado como eu o vejo, sobretudo como eu o sinto. Talvez seja mesmo uma intenção ou uma possibilidade despretensiosa de ver o fado noutra perspectiva, abordado numa fusão e não numa sobreposição. O que eu quero dizer com isso, é que não há uma colagem, ou seja, eu não sou fadista, eu interpreto o fado à minha maneira...também não sou guitarrista de flamenco, mas a sonoridade, alguma técnica e alguns palos, estão lá e quem o ouve identifica. Há os instrumentos relacionados com cada identidade cultural, a guitarra flamenca, a guitarra portuguesa, o saxofone que lhe vem dar outra cor ou a própria percussão a reforçar o ritmo...arrisquei as sonoridades que eu gosto e acredito, mantendo todo o respeito e seriedade que os fados que escolhi merecem. Isto nas versões dos fado, nos originais como são temas meus foi mais um processo “normal” criativo.

PR - “Nem Tudo é fado”, é o resultado das várias experiências musicais vividas nos últimos anos?

Cristina Bacelar - Logicamente que sim. Eu sempre estive ligada a projetos de fusão, sempre gostei, ou fui aprendendo a gostar de mesclar música. Faz todo o sentido na minha cabeça, uma leitura diversificada de vários estilos musicais. Recriar para mim, é uma oportunidade à qual eu vou imediatamente atrás. Gosto de produções mais cruas, onde a música vale pela harmonia e pela melodia e é isso que prevalece e se enaltece... produção exagerada é como uma maquilhagem mal feita, o que supostamente pode ser feito para tapar ou para mostrar em demasiado, pode ser um enorme absurdo ou ridículo. Gosto de coisas simples, sem megalomanias e pretensões. Este meu disco novo é mesmo isso, uma simplicidade inerente a si mesma. Gosto de aproveitar as oportunidades da vida e transformá-las em coisas boas. Nos últimos anos, tive a possibilidade de viver muita coisa quer a nível pessoal, quer musical. Aprendi muito e guardar aprendizagens acho algo de extraordinário e muito bonito. É como gerir emoções, dosear...quando é necessário exterioriza-se. E a música é mesmo isso também. 

PR - O primeiro single deste novo álbum é uma versão ousada e pessoalíssima do clássico “Meu Corpo”,criado para a diva do fado portuense Beatriz da Conceição por Fernando Tordo e José Carlos Ary dos Santos. Este é o tema que melhor caracteriza o “espírito” deste disco?

Cristina Bacelar - É sem dúvida o tema que mostra toda a súmula do disco, todo o conceito. Foi super estimulante para mim, pegar neste tema. É um tema quase perfeito, quer musicalmente, quer em termos de poesia...em termos de interpretação original, é magnífico. Foi uma responsabilidade enorme porque achava tudo perfeito no fado. Mas tinha tanta vontade de o cantar e de o tocar que fui em frente com a minha ideia. Foi o tema que me deu mais trabalho a fazer a versão. Estive um mês a tentar e não gostava de nada que ía refazendo, sentia-me como uma escritora , da altura da grande máquina de escrever, ía escrevendo e tirava rapidamente o papel da máquina para o rasgar… até que acabou por sair o que eu queria.Este disco tem versões de fados e originais, tinha que perceber o que era que eu queria mostrar às pessoas com este disco. Nesta versão do “ Meu Corpo” está tudo aquilo que quero que este disco diga, está o fado, o flamenco, o jazz, dando espaço às palavras brilhantes, como se estivessem atrás da melodia principal e do poema. Tem sensualidade, tem força, tal como este disco.

PR - Neste disco revisita dois fados de Amália Rodrigues – “Lágrima” e Perseguição. Há alguma razão especial por estas escolhas?

Cristina Bacelar - A razão tem só a ver com o meu gosto, aliás como todos os fados que escolhi para o disco. Eu escolhi os fados que gosto mais, há outros que gosto também tanto como estes mas tive que escolher e obviamente que tinha que pensar quais os que se poderiam entrosar no conceito do disco, refiro-me a nível de arranjos,os que melhor se podiam adaptar às minhas ideias. A Lágrima foi o primeiro fado que ouvi quando há muitos anos atrás fui pela primeira vez a uma casa de fados. Apaixonei-me completamente pelo fado! Ainda hoje quando o canto, fico arrepiada, adoro a simplicidade da melodia. É uma versão arrojada, só com voz e saxofone mas para ser igual a tantas outras, não fazia sentido, há fadistas a cantar este fado magistralmente. E consegui ser muito diferente na interpretação da Lágrima, quer em termos vocais, quer pelo arranjo do sax. Eu só sabia cantar dois fados, a Rua do Capelão e a Lágrima. A Perseguição foi o 3º fado que eu aprendi a cantar e fiquei completamente encantada com a interpretação da viola de fado na gravação que tenho em casa desse fado. Comecei logo a pensar nas imensas possibilidades de abordar este fado. 

PR - Depois do disco, vamos ter oportunidade de ouvir as canções deste álbum no palco? 

Cristina Bacelar - Claro que sim. Estou a preparar a minha agenda de concertos. Estou em plena promoção do disco. A estratégia foi diferente para este disco. Só daqui a um mês, dia 24 de Março vou apresentar o disco ao vivo, na Fnac do Norteshopping, às 16.00h e a partir daí começar a tocar. Estou a preparar com os músicos o disco para apresentar ao vivo. 

PR - Numa frase como caracterizaria este “Nem Tudo é Fado”?

Cristina Bacelar - A fusão do fado, do flamenco, do jazz e da balada...“Primeiro estranha-se, depois entranha-se”... e convence!


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