Trinta anos depois do lançamento dos Delfins e vinte anos depois da sua estreia a solo, é com “A Guitarra A Tocar”, que Fernando Cunha, dá os próximos passos. O novo álbum, composto por 14 temas, traduz a forma principal de expressão de Fernando Cunha e o que acredita ainda ser um instrumento que poderá estar “em vias de extinção” no atual panorama pop.
PR - Vinte anos depois da sua estreia a solo, regressa aos discos com “A guitarra a Tocar”. A ideia inicial era fazer um disco instrumental?
Fernando Cunha - Sim, comecei por compor temas instrumentais, partindo de universos mais ambientais do post rock e rock progressivo, onde a guitarra elétrica assume o papel da voz , tocando as melodias principais de cada tema, inspiradas pela contemplação do mar de Cascais, dos ventos da estrada do Guincho, do horizonte mágico da Serra de Sintra, e também pela minha reflecção pessoal de toda uma vida dedicada à música.
PR - Este álbum conta com as colaborações de João Gomes; do pianista/teclista João Pedro Pimenta, de alguns dos mais reconhecidos guitarristas como Tó Trips, João Cabeleira, Flak e Mário Delgado, entre outros. Quer falar-nos um pouco destes “encontros”?
Fernando Cunha - O João Gomes é o meu principal colaborador em estúdio desde 2002. O Primeiro trabalho que fizemos juntos foi na produção do Álbum "Babilónia" dos Delfins, e posteriormente o João fez a tour desse ano como segundo teclista do grupo. Além de teclista é também programador, produtor e técnico de som de estúdio, formado em Inglaterra. Em Londres, onde viveu perto de uma década, foi teclista dos LX 90, e Kick Out the Jam juntamente com os ex Heróis do Mar , Rui Pregal da Cunha ( Cantor) e Paulo Pedro Gonçalves ( Guitarra). Após o regresso a Portugal tocou com vários artistas portugueses como a Áurea, o Mazgani, Rita Red Shoes, Pluto, Ana Stilwell e Delfins entre outros. O João Pedro Pimenta é um grande amigo de longa data, desde os tempos da tropa no CIAAC em Cascais onde nos conhecemos, já lá vão mais de 35 anos...É pianista, produtor , engenheiro de informática e bancário. Destacou-se na música como produtor dos Sitiados nos anos 90. Nessa década, produziu artistas em inúmeros estúdios onde se destaca o Abbey Road Studios em Londres. Toca teclados nos temas “Afastei-me “ e “Não sei se penso em tudo”. Quanto aos guitarristas convidados: O Tó Trips, que conheço desde os tempos dos concertos dos Lulu Blind no Johnny Guitar e cuja a carreira nos Dead Combo sempre acompanhei, pois sou um grande fã do grupo. A verdade é que por incrível que pareça, ao longo de todos estes anos , nunca tínhamos tocado juntos, até ter surgido esta oportunidade. Acho que a guitarra dele entrou muito bem no tema “Se Os Gestos São Palavras”, pois é uma guitarrista com um estilo próprio original e único de tocar. O Flak, é um dos guitarristas portugueses que mais gosto, principalmente pelo bom gosto dos arranjos e sonoridades de guitarras que tem desenvolvido desde os tempos dos Rádio Macau, Micro Audio Waves , Palmas Gang a solo etc... e que para mim, tinha de estar presente neste disco da “Guitarra a Tocar”. É também um excelente autor/compositor e produtor. Quando o convidei, enviei-lhe uma maqueta com 2 ou 3 temas , e ele escolheu o tema “ Não sei se penso em Tudo”, enviando-me passado algum tempo a maqueta de volta com mais os ficheiros de umas 5 ou 6 pistas de guitarra com várias malhas e sons que gravou no estúdio dele. Depois ligou-me e disse, “Fernando tens aí várias ideias , para escolheres as que gostares mais para o tema...” E assim foi... Mesmo à Flak! O João Cabeleira, dispensa apresentações , pois é o guitarrista dos Xutos & Pontapés que todos conhecem. Sem dúvida um dos melhores Guitarristas solo de Portugal, com um som próprio inconfundível e que fez um excelente solo precisamente no tema que dá o nome ao meu álbum “ A Guitarra a tocar”. Foi fantástico poder contar com ele. Lembro-me da primeira vez que o vi a tocar, há muitos anos no Rock Rendez Vous quando ainda era guitarrista dos Vodka Laranja, já nessa altura me impressionou o som e a sua forma de tocar. Pouco depois desse concerto foi convidado para entrar nos Xutos . O Paulo Pedro Gonçalves, É também um grande senhor do rock, foi a minha primeira grande referência do Pop/Rock Português , um guitarrista sempre irreverente e inovador nos Heróis do Mar. Após o fim dos Heróis, fundou com o Rui Pregal da Cunha (Cantor dos Heróis) os LX 90 e posteriormente os Kick Out The Jam. Conheci o Paulo através do Pedro Ayres Magalhães, ainda antes dos Heróis do Mar, eles tinham uma banda punk que se chamava “ Os Faíscas” e que deu origem mais tarde aos Corpo Diplomático, já com o Carlos Maria Trindade nos teclados , banda que lançou apenas um LP “ Música Moderna”, mas , que se tornou um disco de culto até aos dias de hoje. Esta banda seria o embrião dos Heróis do Mar. O João Alves, é um dos Guitarristas dos Peste e Sida, banda histórica do Punk Rock Português, também guitarrista e cantor dos Kamones , Banda de tributo aos Ramones entre outros projetos. É um excelente guitarrista, bastante versátil, e participou nos arranjos de guitarra em 4 temas. E por último o Mário Delgado, um grande mestre da Guitarra elétrica, professor de Jazz , meu colega da Resistência, e que chegou a tocar nos Delfins viola de 12 cordas na tour do álbum “ Ser Maior” em 93. É um excelente Guitarrista e arranjador , com uma cultura musical enorme e que se adapta como ninguém a diferentes estilos de música sempre com muito bom gosto. Podem ouvi-lo no meu cd no tema “Dizem”, onde toca um solo de Lap Steel Guitar. É um músico que para além da Resistência e também de outros grupos como os TGV, Lokomotiv e Led On (Banda de tributo aos Led Zeppelin) para além das participações em gravações e tour de muitos grandes nomes da musica em Portugal .
PR - Acredita mesmo que a guitarra é um instrumento que poderá estar “em vias de extinção” no atual panorama pop”?
Fernando Cunha - Bem, para mim, é um fato que nos últimos anos, a guitarra elétrica tem vindo a perder bastante protagonismo na música pop, basta ouvir o que a malta mais jovem ouve , ou as principais rádios nacionais, tops de streaming e youtube para constatarmos que a música eletrónica , Hip hop, rap , os varios estilos de dance music produzida por DJ´s está constantemente a aumentar de airplay . Se esta tendência irá continuar, não sabemos, mas até lá , enquanto guitarrista e fan de música que crecseu na era dos Guitar Heros vou tentando chamar a atenção desta nova geração e das seguintes para o fantástico instrumento que é a guitarra elétrica, com todas as sua inúmeras possibilidades criativas de diferentes estilos e sonoridades que se podem desenvolver dentro da música pop.
PR - “Afastei-me”, “Hoje” e “Se Eu Pudesse Um Dia” são alguns dos temas clássicos dos Delfins que ganham uma nova vida neste disco. Há alguma razão especial para estas escolhas?
Fernando Cunha - Sempre gostei muito de fazer novos arranjos para temas já gravados, muitas vezes fazíamos novas versões, apenas para os concertos ao vivo dos Delfins, permitindo surpreender o público criando momentos especiais, e mais tarde começamos a gravar algumas delas, tanto nos Delfins como em outros projetos. Foi o que aconteceu por exemplo com projeto Resistência onde desenvolvemos um som de arranjos de guitarras acústicas, que iam desde a Guitarra Clássica, Flamenca, Folk à Folk de 12 cordas. Para mim, é sempre desafiante desconstruir e voltar a construir um tema e dar-lhe o nova leitura, e por vezes uma nova vida. Neste disco escolhi, os temas “ Afastei-me”, “Hoje” e “Se Eu Pudesse Um Dia” , por terem cada uma delas marcado períodos importantes da minha vida e cujas letras se enquadram bem no espírito contemplativo e de reflexão deste disco.
PR - Numa frase como caracterizaria este “Guitarra a Tocar”.
Fernando Cunha - É uma viajem de reflexão e contemplação sobre os horizontes de uma vida.
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