Depois de "A Revolta dos
Badalos" (2006) e "Transumâncias Groove" (2009), já está disponível nas lojas o 3º capítulo da "aventura musical" dos Uxu Kalhus - "Extravagante", "um objecto de tele-transporte cultural do passado para o presente". Hoje recebemos no Portugal Rebelde o Tó Zé e o Paulo Pereira, que em "Discurso Direto" nos falam desta "revolução" que é (re)inventar o nosso património musical.
Portugal Rebelde - Ao
3º disco, uma vez mais, os Uxu Kalhus têm como ponto de partida a
“tradição”, cruzando-a com a modernidade. Parafraseando o Tiago
Pereira, é a Música Portuguesa a Gostar dela Própria?
Tó Zé - Temos um imenso património que é nosso e que é preciso
(re)descobrir. Ao contrário do que aconteceu nos Séculos XV e XVI,
é preciso direccionar as caravelas para dentro mas, como eles, sem
perder o pé no presente e com as âncoras bem assentes no futuro. E
há um “património urgente” - é desse que trata a Música
Portuguesa a Gostar dela Própria. Nós cruzamos tradição e
contemporaneidade porque o nosso tempo é o tempo em que vivemos
agora e fazemos isso por gosto e opção. Uxu Kalhus tiveram sempre
como ponto de partida a tradição, não por saudades do passado, mas
do futuro. Porque temos saudades da música que ainda não tocámos e
nem ouvimos, mas sabemos que nos está entranhada na pele.
Paulo Pereira - A opção de celebrar a nossa identidade sem preconceitos vem na
continuidade do nosso trabalho anterior que já conta com 12 anos, mais
de 600 concertos e bailes, três discos e um vídeo de um concerto ao
vivo. Somos pioneiros do folk em Portugal e do folk em Português e as
razões que nos motivaram quando nos juntámos pela primeira vez com o
objectivo de devolver a música e o baile tradicional ás ruas são hoje
ainda mais válidas. Ainda existe muito preconceito relativamente a tudo o
que tenha a ver com folclore e as nossas raízes, e é esse preconceito
que combatemos, gostando do nosso folclore, dos nossos tocadores
tradicionais, dos nossos velhinhos mas traduzindo esse amor em
sonoridades contemporâneas, datas dos tempos em que vivemos.
PR - Ao longo dos 11 temas deste disco combinam novas abordagens ao cancioneiro português e composições originais, sempre num toque festivo e camaleónico, como é habitual na banda. Sentes que foram mais ousados e determinados na procura de uma sonoridade única para este “Extravagante”?
TZ - Uxu Kalhus procuraram sempre uma sonoridade única. Somos uma banda que trabalha em colectivo, cada um dos músicos dá a sua contribuição para o produto final. O resultado geralmente excede a soma das partes. Desta vez, temos uma nova formação, novos instrumentos e quisemos aproveitar ao máximo todas as possibilidades que a técnica e a tecnologia nos oferecem. Na composição e arranjos, virámos muitas coisas ao contrário e entrámos pelos caminhos do modalismo (quase extremo em alguns temas). Combinámos instrumentos eléctricos e acústicos, que nem sempre explorámos da maneira mais convencional, com o mundo digital e objectos do quotidiano - uma velha tv, um pacote de batatas fritas e o som das mesmas a serem dilaceradas por um dos músicos fazem parte do álbum -, um destes dias ainda fazemos um passatempo para ver quem descobre onde estão. A formação estabilizada permite-nos a determinação maior nas ousadias melódicas e harmónicas e também a exploração de novas texturas sonoras.
PR - Ao longo dos 11 temas deste disco combinam novas abordagens ao cancioneiro português e composições originais, sempre num toque festivo e camaleónico, como é habitual na banda. Sentes que foram mais ousados e determinados na procura de uma sonoridade única para este “Extravagante”?
TZ - Uxu Kalhus procuraram sempre uma sonoridade única. Somos uma banda que trabalha em colectivo, cada um dos músicos dá a sua contribuição para o produto final. O resultado geralmente excede a soma das partes. Desta vez, temos uma nova formação, novos instrumentos e quisemos aproveitar ao máximo todas as possibilidades que a técnica e a tecnologia nos oferecem. Na composição e arranjos, virámos muitas coisas ao contrário e entrámos pelos caminhos do modalismo (quase extremo em alguns temas). Combinámos instrumentos eléctricos e acústicos, que nem sempre explorámos da maneira mais convencional, com o mundo digital e objectos do quotidiano - uma velha tv, um pacote de batatas fritas e o som das mesmas a serem dilaceradas por um dos músicos fazem parte do álbum -, um destes dias ainda fazemos um passatempo para ver quem descobre onde estão. A formação estabilizada permite-nos a determinação maior nas ousadias melódicas e harmónicas e também a exploração de novas texturas sonoras.
PP -
A nossa estética e abordagem dependem do colectivo que trabalha as
musicas. O extravagante resulta de seis vontades que se conjugam (sempre
com bastante esforço para nos entendermos) num objecto único, que
transcende e muito as nossas múltiplas individualidades. A banda é um
espaço de liberdade extrema, e como em qualquer outro domínio, a
liberdade é um exercício difícil mas extremamente compensador. Por isso,
e porque não fazemos concessões ao que esperam de nos, chegamos a uma
sonoridade que tem como único limite a nossa imaginação. O tempo de
maturação de muitas musicas permitiu-nos também polir os arranjos até
estarem de acordo com o que almejávamos. Por isso, o "extravagante"
resulta também de um longo processo criativo ao longo do qual as musicas
foram evoluindo através da nossa interacção com o publico. O resultado
final é mesmo isso, um produto acabado em que a banda se revê.
PR - No press release afirmam: “Extravagante milita e promove o ideal de liberdade de criação e recriação do património musical português”. Para os Uxu Kalhus, o património musical não é algo de intocável?
TZ- Preferimos o património vivo ao património morto. Ambos fazem sentido e comportam muitos e variados riscos e benefícios. Estudar o património e fazer recriações históricas é pedagógico e importante que se faça, mas não deixa de ser uma reprodução subjectiva do que se pensa que possa ter sido. Por outro lado, a reprodução, por si só, é também um elemento estrangulador para o próprio património, impedindo que ele se recrie a si próprio, como o fez naturalmente até ao momento em que se considera que “é assim”. E vestem-se trajes e toca-se da mesma maneira que se fazia nos anos 50 ou 60 do Século passado e não se deixa entrar mais nada. Respeitamos quem honestamente faz reproduções e agradecemos esse trabalho, não só enquanto músicos. Nós preferimos dar o nosso contributo por “afecto”. Pegamos na tradição e damos-lhe o que somos agora, que é o mesmo que dar o coração. Reinventamos os temas que gostamos e compomos música original a pensar em formas populares e da tradição, com os instrumentos que temos à disposição e as limitações que temos enquanto músicos. O desafio é exceder sempre. O património não é intocável, se o fosse, deixaria de ser nosso.
PR - No press release afirmam: “Extravagante milita e promove o ideal de liberdade de criação e recriação do património musical português”. Para os Uxu Kalhus, o património musical não é algo de intocável?
TZ- Preferimos o património vivo ao património morto. Ambos fazem sentido e comportam muitos e variados riscos e benefícios. Estudar o património e fazer recriações históricas é pedagógico e importante que se faça, mas não deixa de ser uma reprodução subjectiva do que se pensa que possa ter sido. Por outro lado, a reprodução, por si só, é também um elemento estrangulador para o próprio património, impedindo que ele se recrie a si próprio, como o fez naturalmente até ao momento em que se considera que “é assim”. E vestem-se trajes e toca-se da mesma maneira que se fazia nos anos 50 ou 60 do Século passado e não se deixa entrar mais nada. Respeitamos quem honestamente faz reproduções e agradecemos esse trabalho, não só enquanto músicos. Nós preferimos dar o nosso contributo por “afecto”. Pegamos na tradição e damos-lhe o que somos agora, que é o mesmo que dar o coração. Reinventamos os temas que gostamos e compomos música original a pensar em formas populares e da tradição, com os instrumentos que temos à disposição e as limitações que temos enquanto músicos. O desafio é exceder sempre. O património não é intocável, se o fosse, deixaria de ser nosso.
PP -
Desde o início que essa é a nossa abordagem: apostar na nossa riqueza
cultural única e usar e abusar desse incrível património como material
de construção das nossas músicas. Somos tudo menos puristas, não
fazemos recolhas, aprendemos diretamente sem intermediários e recriamos à
nossa medida tudo o que absorvemos. Estarmos espalhados pelo pais, do
norte ao Sul de Portugal facilita o processo de retransmissão e todos os
dias encontramos musicas que queremos trabalhar ou ritmos e danças que
nos servem de inspiração. O resultado é muitas vezes imprevisível, mas
quase sempre dançável, e é para nos uma grande alegria ver um sala cheia
de gente a dançar uma cana verde do século XXI. Estamos a reinventar o
nosso cancioneiro, e isso é o que nos motiva.
PR - Algumas das canções deste disco já foram apresentadas ao vivo. Qual tem sido o “feedback” do público?
TZ - É curioso falares em canções. Nunca foi preocupação da banda fazer canções, pelo menos na forma “normal”: letra com refrão e possibilidade de redução harmónica para tocar com um instrumento e voz. Este disco tem algumas canções e ficamos contentes com isso. Apareceram e são bem vindas. Destaco aqui a participação do Daniel Catarino (Uaninauei, Bicho do Mato, O Rijo), que escreveu as letras do “Tango Manso” e da “Valsa do Opilião”. O disco tem sido apresentado ao vivo na íntegra e, até agora, estamos muito satisfeitos com as reacções do público, com o que de subjectivo isto tem. Fazemos música para nós e para o público e temos tido muita gente nos concertos. E gente que dança, bate o pé e abana a cabeça. Gostamos.
PR - Algumas das canções deste disco já foram apresentadas ao vivo. Qual tem sido o “feedback” do público?
TZ - É curioso falares em canções. Nunca foi preocupação da banda fazer canções, pelo menos na forma “normal”: letra com refrão e possibilidade de redução harmónica para tocar com um instrumento e voz. Este disco tem algumas canções e ficamos contentes com isso. Apareceram e são bem vindas. Destaco aqui a participação do Daniel Catarino (Uaninauei, Bicho do Mato, O Rijo), que escreveu as letras do “Tango Manso” e da “Valsa do Opilião”. O disco tem sido apresentado ao vivo na íntegra e, até agora, estamos muito satisfeitos com as reacções do público, com o que de subjectivo isto tem. Fazemos música para nós e para o público e temos tido muita gente nos concertos. E gente que dança, bate o pé e abana a cabeça. Gostamos.
PP -
A reacção tem sido sempre positiva, e cada vez mais sentimos que
chegamos a mais pessoas. Esse é sempre o objectivo da criação artística,
o de chegar às pessoas. Fazê-lo sem recorrer a formulas fáceis,
apostando em composições nossas e arranjos completamente radicais, é uma
grande vitória, e sentimos que conseguimos chegar a qualquer tipo de
publico, e todos reconhecem as nossas raízes musicais nos concertos que
fazemos. Seria muito mais fácil termos apostado num folk internacional
ou piscar o olho à música do mundo e assim cairmos no goto das gentes
bem-pensantes e dos fazedores de opinião. Mas esse não é o caminho que
escolhemos, e cada vez mais me alegro por desbravarmos o nosso próprio
trilho e assim construir um legado ímpar no que à música de raiz
tradicional diz respeito.
PR - ”A Saia da Carolina” e “Erva Cidreira” são dois temas revisitados neste disco. Com a entrada da Joana Margaça para a banda, impunha-se uma nova leitura para estes temas?
TZ - Uxu Kalhus não dão nenhum tema por terminado. A gravação em disco é um registo do momento. Os temas são organismos vivos e sofrem alterações à medida que os tocamos – há sempre espaço para o improviso. Com a entrada da Joana e do André, que trouxeram novos timbres à banda, impunha-se uma nova abordagem destes temas, que tivesse em conta o momento actual da banda. É um registo mais próximo daquilo que temos vindo a fazer ao vivo.
PR - ”A Saia da Carolina” e “Erva Cidreira” são dois temas revisitados neste disco. Com a entrada da Joana Margaça para a banda, impunha-se uma nova leitura para estes temas?
TZ - Uxu Kalhus não dão nenhum tema por terminado. A gravação em disco é um registo do momento. Os temas são organismos vivos e sofrem alterações à medida que os tocamos – há sempre espaço para o improviso. Com a entrada da Joana e do André, que trouxeram novos timbres à banda, impunha-se uma nova abordagem destes temas, que tivesse em conta o momento actual da banda. É um registo mais próximo daquilo que temos vindo a fazer ao vivo.
PP - Os nossos temas são evolutivos, mas o nosso trabalho aposta na
continuidade. Esta foi uma forma de termos presente no 3º CD os dois
trabalhos anteriores, permitindo por um lado actualizar esse repertório e
ajusta-lo à formação actual e por outro lado mostramos o nosso trabalho
de doze anos a novos públicos. E claro, são temas que nos continuam a
surpreender, por darem origem sempre a novas ideias e novas
interpretações.
PR - Numa frase apenas como caracterizarias este novo trabalho?
TZ - Música portuguesa de fusão para ouvir e bailar no sofá e no salão.
PR - Numa frase apenas como caracterizarias este novo trabalho?
TZ - Música portuguesa de fusão para ouvir e bailar no sofá e no salão.
PP - O "extravagante" é um objecto de tele-transporte cultural do passado para o presente.
PR - Sentes
de alguma forma, que para os puristas da “tradição”, este
poderá ser um disco “Extravagante”?
TZ -
É uma pergunta que terás de fazer aos “puristas da tradição”.
Quem são?
PP - É capaz... As
revoluções sempre tiveram nos conservadores os seus principais
opositores. A nossa revolução é tranquila mas determinada.
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