20/05/2014

MIGUEL ARAÚJO | Discurso Direto


“Crónicas da Cidade Grande”, é este segundo capítulo da aventura a solo de Miguel Araújo. Depois do êxito de “Cinco Dias e Meio”, o novo disco está intimamente ligado a tudo o que o cantor e compositor portuense fez antes – dos Azeitonas ao Disco de Ouro de “Cinco Dias e Meio”, puxado pelo êxito esmagador de “Os Maridos das Outras”. Mas é também “outra coisa”, um passo em frente, feito com um outro espírito e de outra forma.

Portugal Rebelde - Podemos dizer que as 13 canções deste “Crónicas da Cidade Grande”, ouvidas todas juntas, contam uma história de gente como cada um de nós, mas que, ouvidas separadas, contam todas elas pequenas histórias que todos já vivemos ou a que assistimos?

Miguel Araújo - A ideia é mesmo essa. Por um lado quis que o álbum não fosse um conjunto de peças soltas, por forma a merecer esse estatuto ("álbum"). Por outro, não quis que fosse desadequado para os dias de hoje, em as pessoas ouvem música avulsa. Tive sorte, porque acho que calhou de acontecer mesmo isso. As músicas, a criação das canções, não se submete a este género de pensamentos. Tratei simplesmente de descartar aquelas que não se safavam isoladas.

PR - “Cinco Dias e Meio” era um disco inteiramente criado a solo, em regime espontâneo quase caseiro, “Crónicas da Cidade Grande” foi registado com outro cuidado. Este novo disco foi pensado e gravado com outro “espírito”?

MA - O álbum anterior foi mais directo, mais cru, mais despido e mais espontâneo porque era mesmo esse o meu objectivo. Não acho que tenha sido "descuidado", por oposição a este. Quis mesmo experimentar um disco em que eu soasse a mim próprio, sem truques. Neste, muito até pela cumplicidade que fui criando com o João Martins (arranjador deste disco novo e músico da minha banda), decidi experimentar o oposto: total pré-concepção e preparação. Tentei ir além de mim próprio, pois o João escreveu arranjos que ultrapassam em larga escala a minha capacidade musical, para instrumentos que eu nem ouso tentar tocar. No cinco dias e meio toquei eu os instrumentos todos. Neste, quis ir para além das minhas capacidades. O mais difícil foi fazer como que algum do espírito do 5 dias e meio se mantivesse: principalmente na voz e na guitarra, ou seja, na minha parte. Foi difícil mas acho que foi conseguido.

PR - “Balada Astral”, foi o single escolhido para apresentar este “Crónicas da Cidade Grande”. Como é que uma ilustre desconhecida, como a Inês Viterbo, surge neste tema?

MA - Obra do acaso. A Inês era desconhecida até para mim. De todos os convidados, era a única com quem eu não tinha uma amizade pré-estabelecida, algo que acontece no caso do Zambujo e do Marcelo. Conheci-a no casamento de uns amigos, ela fazia parte do coro da igreja. Como eu ia cantar esta música aos noivos, para quem a música foi escrita, achei que ficaria bem um dueto com uma voz feminina. Então convidei-a para cantar comigo no casamento, depois convidei-a para um concerto, e por fim convidei-a para entrar no disco. Ela, que não tem nada a ver com estas andanças da música profissional, muito generosamente aceitou todos os convites.

PR - Sabíamos da tua cumplicidade com António Zambujo, mas a grande surpresa para muitos será a presença de um dos novos cantautores de referência da música brasileira, Marcelo Camelo, em “Valsa Redonda. Como é que se deu este “encontro”?

MA - Conheci o Marcelo por volta de 2005 ou 2006, numa vinda dos Los Hermanos ao Porto. Conhecemo-nos e ficámos amigos, fizemos uma noitada de música bastante memorável. E fomos mantendo o contacto. Sempre que o Marcelo vinha cá acabavamos sempre nesses encontros musicais em casa de alguém, muitas vezes na minha. Por isso não foi surpresa nenhuma para mim ou para ele, julgo, este convite. Fiquei muito feliz, claro, porque sou muito fã dele, e é das maiores honras da minha vida, este dueto.

PR - A edição exclusiva deste novo trabalho inclui um DVD com um concerto registado na Casa da Música, no Porto. O palco é um lugar “mágico” para ti?

MA - Às vezes. Mas é raro. Adoro a estrada, os ensaios, os testes de som, as viagens, etc. Mas dos concertos nunca gosto assim tanto... porque fico um bocado nervoso e não tenho grande perfil de "performer". Fico sempre muito "auto-consciente". Quando estou em palco não me posso furtar a ser performer, e talvez seja essa a mais frágil de todas as minhas características, a performance. O Pedro Santos (baixista) e eu brincamos sempre com o facto de que adoramos soundchecks e o quão lamentável é o facto de que dali a umas horas o local vá estar pejado de gente! Mas às vezes, por qualquer razão, sinto-me bem, e aí é bom. Mas não me posso queixar: cada vez gosto mais e ficaria muito infeliz se não existisse essa parte, a da música ao vivo.

PR - A tour de apresentação deste novo disco termina no Coliseu do Porto a 29 de Novembro. Que “surpresas” estão reservadas para este regresso ao Coliseu, agora em nome próprio?

MA - Ainda não sei. Ainda falta muito tempo! Mas há de me ocorrer qualquer coisa até lá.

PR - Para terminar, numa frase apenas – ou talvez duas – como caracterizarias este disco?

MA - É o disco que eu quis fazer neste momento: sem tirar nem pôr. Foi feito com muito carinho por muita gente, e acredito mesmo que essas coisas passam para a música, de uma maneira quase palpável. De tal forma que, logo eu que ligo tanto ao que os outros pensam, e fico abalado com más críticas, no caso deste disco sou totalmente imune. Como se o disco fosse lateral a qualquer opinião que possam ter sobre ele, boa ou má. Nem sei bem explicar isto, mas a ideia de corresponder a expectativas pura e simplesmente não aconteceu, no processo todo deste disco. Coisa inédita, no meu caso.


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