18/12/2015

ALINE FRAZÃO | Discurso Direto


Figura de proa da nova geração de músicos angolanos, Aline Frazão é uma das mais promissoras artistas do universo lusófono. Cantora, compositora, guitarrista e produtora, nasceu em Luanda em 1988 e por lá cresceu. Vive atualmente em Lisboa. Aline Frazão acaba de editar “Insular”, o seu terceiro disco de originais e um álbum que consolida definitivamente o seu espaço na nova música lusófona.

Portugal Rebelde - Quando partiu para a pequeníssima ilha escocesa de Jura, era um passo "para descobrir quem sou quando chegar", como canta em "O homem que queria um barco"?

Aline Frazão - Exactamente. Essa música e "O Conto da Ilha Desconhecida", de José Saramago, acabaram por resumir um pouco o estado de espírito dos dias que precederam a minha ida para Jura. A decisão foi arriscar, ir à procura de algo novo, algo desconhecido mas algo que também fosse eu e a música que faço. E esse verso em particular resume tudo: "p'ra descobrir quem sou quando chegar", mesmo que o importante seja, no fundo, a viagem.

PR - Para agitar a sua música, rodeou-se da guitarra de Pedro Geraldes (Linda Martini). São estas as guitarras que ajudam a carregar o tom melancólico que assola este "Insular"?

Aline Frazão - Sem dúvida. A presença do Pedro neste disco é absolutamente decisiva para chegar a essa tal de Ilha Desconhecida. Estou sempre a dizer que aprendi muito com ele, acho que aprendemos um com o outro desse encontro improvável. E as músicas crescem muito com a guitarra eléctrica do Pedro, é um músico muito intenso e dedicado. Também o trabalho de criação de ambientes e paisagens sonoras que fez o produtor, o Giles Perring, faz a diferença. O Giles vem de uma geografia musical oposta à minha, partilhamos muito poucas referências. Também foi muito interessante trabalhar com ele, adaptar-me ao seu método de trabalho, ele ao meu.

PR - "Susana", tema que fecha este "Insular" conta com a participação de Toy Sa´Med. Quer falar-nos deste encontro?

Aline Frazão - O Toty é um músico angolano da minha geração. Somos amigos há muito tempo e já tocámos juntos imensas vezes. Costumo dizer que eu e ele vimos do mesmo sítio. Era inevitável que os nossos caminhos se juntassem num disco e a gravação de "Susana" era a oportunidade perfeita. Gravamos "ao vivo", na cave de um teatro lisboeta, para aproveitar a reverberação natural do espaço. Foi super espontâneo e natural. É um semba antigo, da autora Rosita Palma, uma das canções mais bonitas da música popular angolana. Há muito que queria gravar um semba em kimbundo. E tinha que ser com o Toty. Ele ainda vai dar que falar. Além de excelente guitarrista, tem uma voz linda e compõe muito bem também. É um dos grandes nomes da nova música angolana.

PR - "Insular", foi a canção escolhida para single de apresentação deste 3º registo. Este é o tema que melhor trata o "espírito" deste disco?

Aline Frazão - Eu penso que sim. No entanto, foi uma escolha difícil porque o disco todo tem um fio condutor que nos leva da primeira à última música, como se nenhuma delas devesse ser ouvida em separado. "Insular" abre o disco e mostra bem a nova estética, a paisagem sonora, as guitarras do Pedro Geraldes, o delay na minha guitarra também... E depois a letra fala de uma viagem até uma ilha, à procura de paz, em contraste com o caos da cidade, "a insónia nacional, tempestade irracional", sendo que no final se descobre que o que faz sentido é voltar, voltar a esse sul imaginário onde está a partilha, o calor do contacto, a raiz, o oposto de ilha. Essa é, no fundo, a estória deste disco, uma estória de ida e volta.

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