"Duas décadas após ter editado Letras do Fado Vulgar, o primeiro livro de poemas para fado de Vasco Graça Moura, a Quetzal lança esta sexta-feira o livro A Puxar Ao Sentimento, que reúne um lote de poemas, na sua esmagadora maioria inéditos, tal como o poeta e ensaísta os deixou prontos para publicar. O título é dele, tal como o subtítulo, “trinta e um fadinhos de autor” mas este não é totalmente exacto, já que o livro contém 31 fados, sim (três deles com variantes de versículo), mas a estes acrescenta-lhes uma marcha (quero marchar na avenida), que encerra a obra.
O livro Letras do Fado Vulgar (Quetzal, 1997) teve reedição aumentada em 2001 e deu, mais tarde, origem a um outro livro de Vasco Graça Moura intitulado Mais Fados & Companhia (com edição do Público e da Corda Seca, em 2004). Na apresentação deste, escrevia então o autor: “Pensei que não viria a reincidir nessa tentativa de escrever para o mais popular dos nossos géneros cantados. Todavia, em princípios de 2003 e a pedido de Mísia, concordei em escrever uma série de letras para outras tantas músicas de Carlos Paredes, de que ela gravou a maior parte. (…) Foi durante a feitura dessas peças que muitas outras ideias, que nestas coisas são como as cerejas, suscitadas à medida que os referidos textos iam sendo construídos para essa colaboração e discutidos com Mísia, deram lugar a mais uma série de letras para fado.”
O poeta e ensaísta dedicava, no final da apresentação, essa edição “a algumas pessoas que entretanto acabaram por ficar mais concretamente ligadas a ‘exercícios’ meus de letrista de fados, dando-lhes corpo musical e vocal: Ana Sofia Varela, António Pinto Basto, Carlos do Carmo, Cristina Branco, Custódio Castelo, Fernando Tordo, José Campos e Sousa, Mário Pacheco e Mísia.”
O livro actual não tem qualquer introdução, até para respeitar o espírito do autor. Que nestas novas letras para fado explora várias métricas e estruturas: quadras, quintilhas, sextilhas, oitavas, décimas. O poema quis dar ao fado o meu nome (na escrita destes versos, Vasco Graça Moura não usa nunca maiúsculas), em quintilhas, tem, por exemplo, uma variante em oitavas onde se estende a dois outros géneros musicais: “quis ao tango [ou “quis ao samba”] dar meu nome.”
Dos 31 fados incluídos no livro, há pelo menos três que já foram gravados: as quatro operações e até ao fim, amor, ambos por Katia Guerreiro; e talvez, por Carminho. Mas mesmo os inéditos revelam já uma musicalidade intrínseca que denota o exercício, familiar ao autor, de os imaginar cantados. Como um novo olhar sobre a “casa da mariquinhas”, que desde Alfredo Marceneiro a Gisela João (com letra de Capicua), passando por Amália Rodrigues, já teve várias vidas. Pois Vasco Graça Moura escreveu mariquinhas ponto com. Alguns excertos: “o site dela promete/ só meiguices e fosquinhas/ e diz mais nas entrelinhas/ a quem quer pintar o sete// o progresso é mesmo assim/ hoje não há nada inédito/ usa-se o cartão de crédito/ paga-se antes e no fim/ (…) se é altiva entre as vizinhas/ virtuosa não será/ mas virtual já se fez/ a formosa mariquinhas.”
A Quetzal Editores anuncia esta publicação “como uma forma de continuar a recordar uma das grandes vozes da poesia e da literatura do nosso tempo.” Vasco Graça Moura, poeta e ensaísta, morreu em 2014. Entre outras distinções, recebeu o Prémio Pessoa (1995), o Prémio de Poesia do Pen Clube (1993), o Grande Prémio de Poesia da APE (1998), o Grande Prémio de Romance e Novela APE/IPLB (2004) e os prémios Vergílio Ferreira e de Poesia Max Jacob Étranger (2007)." (Nuno Pacheco, in Jornal Público)
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