19/02/2021

DADA GARBECK | Discurso Direto


Está disponível a partir de hoje em todas as plataformas digitais o terceiro capítulo da tetralogia discográfica iniciada por Dada Garbeck em 2018. "Cosmophonia", sai com selo Discos de Platão e propõe-nos um novo mergulho no trabalho do músico vimaranense. Dada Garbeck é hoje meu convidado em "Discurso Direto".

Portugal Rebelde - “Cosmophonia” é o terceiro álbum da tetralogia começada em 2019. Qual é o fio condutor que une estes quatro discos? 

Dada Garbeck - Os quatro discos da tetralogia “The Ever Coming” estão unidos pela ideia do eterno retorno ou, se quisermos, da circularidade. Nesta tetralogia dediquei-me sobretudo à música circular, uma música que, ao ouvir, nos leva para um não lugar e um não tempo. É como se se desse lugar à descoberta de que o tempo, efetivamente, não é linear. Para além disso, os sintetizadores analógicos e a tradição oral, são também eles uma presença constante. 

PR - “Cosmophonia” tem uma abordagem muito mais jazz do que os teus últimos dois álbuns. Deve-se a alguma razão especial? 

Dada Garbeck - Essa sonoridade mais jazz acontece de uma forma natural. A minha formação de base é clássica com ramificações posteriores para o jazz. Parece-me que a mistura destes dois universos tem vindo a estar presente e com este disco afirma-se ainda mais. E mais uma vez interessou-me testar os limites ou os não limites da música eletrónica circular, neste caso com composições estabelecidas numa fronteira que ainda não tinha tocado. Os músicos que convidei, sendo eles do jazz, reforçam ainda mais essa ideia, pelo seu próprio som e forma de interpretar as composições. 

PR - Para além do jazz, está presente também uma inclinação para a música tradicional, nomeadamente em “Labrador do Minho”. Sei que também desenvolves trabalho junto da comunidade. Podes falar um pouco mais sobre estas facetas? 

Dada Garbeck - Em toda a tetralogia, a música tradicional, cultura popular, tradição oral são uma grande chave para todo este trabalho. E todos os discos refletem bem esse caráter. Uma das razões pelas quais desenvolvi uma paixão pela tradição oral e escolhi começar a estudá-la e torná-la parte da minha vida, é precisamente o facto de desenvolver inúmeras criações artísticas com a comunidade. Já tive o prazer de o fazer em diversos países assim como um pouco por todo o Portugal. Estar junto das pessoas, criar e habitar um espaço e um determinado tempo com elas é um dos principais sentidos da minha vida. Há poucas coisas que me dão tanto prazer como estar juntos da comunidade a existir com eles. Se pudermos fazer arte, então ainda melhor. Como consequência desse trabalho vou fazendo uma recolha extensiva de cantares da tradição oral. O “Labrador do minho” é uma Boiada (de entre muitas outras) do minho. 

PR - Neste momento és diretor musical do Teatro da Didascália, em Vila Nova de Famalicão. Sentes que existe alguma “contaminação” de uma vertente mais cénica ou performativa no trabalho que desenvolves na música? 

Dada Garbeck - É inevitável que a minha ligação ao teatro que se foi tornando cada vez mais expressiva, me influencie todos os dias. Isso trouxe-me uma capacidade e sensibilidade de conseguir ver um objeto artístico em toda a sua extensão. Seja do ponto de vista da performance, da luz ou do contexto. E o contacto permanente com o teatro também me permite, todos os dias, conhecer coisas novas. Obriga-me também a pensar todos os dias. A influência do “Teatro” no meu trabalho individual é uma das coisas fulcrais que me fazem ser quem sou. 

PR - Se o teu último álbum, “Vox Humana” era uma ode à voz, “Cosmophonia” é uma ode a quê?

Dada Garbeck - “Cosmophonia” tenta precisamente cruzar os limites com o jazz através dos sopros. Se no primeiro dei lugar às vozes, neste pretendia desenvolver um trabalho com um foco nos sopros. Neste caso, no saxofone temos João Mortágua e no trompete, Ricardo Formoso. E desta vez foram eles que deram voz aos sopros. 

PR - A música que fecha o disco, “Washam”, remete para a “Repeat” do álbum anterior. Esta referência pretende acentuar a circularidade e autorreferência do projeto? 

Dada Garbeck - Precisamente. A tetralogia é uma peça só com idas e voltas, com circularidades e até redundâncias se quisermos. Até então, os três discos estão cheios dessas voltas, umas mais assumidas, outras menos. Este disco tem outras voltas e outros reencontros ainda que deixarei para descoberta dos ouvintes. Essa circularidade ou tontura boa é, claro, o grande chavão. Afinal de contas, a vida anda sempre às voltas.

Sem comentários:

/>