12/10/2018

OLD JERUSALEM | Discurso Direto


Old Jerusalem edita hoje o 7º álbum de originais. “Chapels” é uma colecção de canções imediatas e sem adornos. O que se ouve é praticamente a primeira fixação gravada de cada um dos 10 temas que compõem o disco, em interpretações ainda intimamente associadas ao processo da sua escrita e deixando a nu os alinhavos de arranjos e as primeiras sugestões de caminhos melódicos e harmónicos. Pretendeu-se, segundo Old Jerusalem que cada canção veiculasse assim o seu primeiro ímpeto criativo e a urgência da sua comunicação. Francisco Silva, desvenda hoje em "Discurso Direto" as dez canções de "Chapels".

Carnation day" + "How beautiful, that"

O Jorge Coelho, de cujo trabalho sou fã há longos anos, enviou-me uns quantos trechos de guitarra a ver se me ocorria alguma coisa que pudesse acrescentar-lhes. Cada uma dessas colaborações livres foi tomando rumos diferenciados, mas estes dois trechos em particular pareceram-me perfeitos para usar como "bookends" do disco que estava a preparar, pelo que me apropriei deles para Old Jerusalem. Como quase todos neste disco, os temas aparecem no seu primeiro registo e não foram re-gravados, o que quer dizer que, junto com a nossa prestação (minha e do Jorge), se consegue discernir também a colaboração da máquina de secar do 6º esquerdo...

Black pool of water and sky

Tema que se tornou fulcral na estrutura e na ideia deste disco. É uma canção "informada" por outra, do Phil Elverum / Mount Eerie ("Ancient questions", que é inclusivamente citada na letra num par de momentos) e como os 2 temas estavam bastante relacionados fiz uma coisa incaracterística para mim mas que gerou um resultado muito simpático: decidi enviar ao Phil Elverum a minha canção. No dia seguinte recebi a sua resposta,agradecendo e dizendo que era "a beautiful song". O que, claro, como eles dizem, "made my day".



The meek

Uma pessoa amiga deu-me nota de que se sentiu algo perturbada e até magoada pela narrativa implícita neste tema. Compreendo, e como lhe expliquei, é efectivamente uma "bad vibe song" sobre uma certa forma comum de fraqueza que é justificável mas roça a cobardia e da qual não me isento, pelo que também para mim não é uma canção "confortável".

Oleander

Consta que o oleandro, uma planta tóxica, teria sido usado pela sacerdotisa Pítia para induzir as visões e alucinações que estavam na base das suas profecias. O oleandro é a flor oficial da cidade de Hiroshima, por ter sido a primeira a florescer no local depois da explosão da bomba atómica.

I could never take the place of your man

Sempre que trabalhava nos rudimentos desta canção as palavras que se lhe colavam eram as do "I could never take the place of your man", pelo que se pode dizer que este tema "quis" ser uma versão dessa canção do Prince.

Lighthouse

é uma canção algo escura e, para os parâmetros de Old Jerusalem, quase política, pessimista quanto à capacidade dos poderes instalados em conduzir a bom rumo os nossos destinos colectivos: "the general's wavering, he can't handle the math / so call the troops back, they've been sent to their sure death".

Ancient sand, ancient sea

tem como subtítulo uma linha de uma canção dos Nirvana: "A Leonard Cohen afterworld". É uma canção emotiva com partes que começaram a ser escritas pouco depois da morte do Kurt Cobain. Acresce que por algum motivo obscuro imagino sempre o refrão na voz do Chris Cornell - dois factores que tornaram a canção numa espécie de elegia pessoal a um determinado momento no tempo.

Lucky me

Polaroid de um amanhecer. Uma "love song", no sentido tradicional.

Magna

há uns tempos, no processo semi-consciente que está muitas vezes associado à escrita de canções, "saiu-me" uma referência à Marie Laveau e comecei uma estrofe que fantasiava uma historieta em torno dela e de outro protagonista - Glapion, seu companheiro e amante. Por algum motivo o rumo daquelas personagens tornou-se numa versão mitificada/romantizada (algo caricatural também, é certo) da história de um casal de amigos. Ela, Magna na vida real, misteriosa e com um ar de quem sabe mais do que alguma vez vai dizer; ele "living (a bit) on the edge", há muitos anos, quando éramos todos "apenas miúdos". Não sendo expressa ou literalmente sobre eles, e sendo até uma forma redutora de os representar, é uma canção sobre uma certa e eterna forma de se ser jovem - ou, citando outra canção, de como "to be young (is to be sad, is to be high)"

Sem comentários:

/>