19/03/2021

KIKO & THE BLUES REFUGEES | Discurso Direto


Kiko & The Blues Refugees é um supergrupo formado por músicos experientes e conceituados do panorama nacional: o músico, compositor e produtor Kiko Pereira, luso-americano que o crítico José Duarte elegeu como a melhor voz masculina do jazz em Portugal, junta uma equipa de excelência como António Mão de Ferro (guitarras), Jorge Filipe Santos (teclados), Carl Minnemann (baixo) e João Cunha (bateria). “Threadbare”, o disco de estreia dos Kiko & The Blues Refugees é um filme sonoro que expõe a atualidade de um género universal e das inúmeras estradas por onde ele nos pode levar. Hoje em "Discurso Direto" são meus convidados os Kiko & The Blues Refugees.
 
PR - Que paisagens sonoras percorrer ao longo deste disco de estreia? 

Kiko & The Blues Refugees - As paisagens são um misto de peregrinação onírica por uma Améria imaginária e por um calvário pelo mundo real que nos persegue e nos amedronta. Todos os temas remetem para uma procura mais intensa daquilo que é a nossa história pessoal e o impacto que o quotidiano tem sobre as nossas necessidades e anseios. Acho que todas as canções nasceram de um processo de regressão e auto análise a que não é alheia os 50 anos e aquilo que é o nosso lugar no mundo. 

PR - Este disco com alguns convidados de “peso”, com destaque para a participação de Marta Ren. Querem falar-nos um pouco deste encontro? 

Kiko & The Blues Refugees - O encontro com a Marta foi uma inevitabilidade. Sempre fui fã confesso da sua voz, alma e música e quando escrevi a canção pensei na voz dela como elemento sine qua non para a sua viabilidade. Se me tivesse dado uma nega talvez não tivesse gravado a canção. Mas foi provavelmente a única participação vista com alguma ponderação. No caso da Mila Dores decidi que seria a voz ideal para as canções uns dias antes de gravar por me ter cruzado com ela, aparentemente por casualidade, num concerto do Seamus Blake em que ela participou. O BJ Cole foi também fruto de um momento e acaso feliz em que o António Mão de Ferro falou de um efeito pedal steel guitar no “If this is the end of me” e acabamos por fazer o convite que ele muito generosamente aceitou depois de ter ouvido a canção. O João Andressen é um talento na harmónica, um entendido no blues e um gentleman. Os convidados não foram acrescentos, foram peças fundamentais para criar um todo coeso e fomos agraciados pela sua generosidade e arte. Não é isso que a arte é? 

PR - “Giver” é a melhor porta de entrada para descobrir este disco? 

Kiko & The Blues Refugees - Não sei se será o melhor, foi o mais óbvio na altura. Mas este é um álbum visto de um ponto de vista conceptual. A primeira canção lança o repto sobre a questão essencial (para mim) que é se este é o meu fim então que seja um final feito de ações consequentes e fica então dado o mote para as reflexões seguintes sobre a justiça, a partilha, a honestidade e outras que se vão sucedendo até ao regresso ao final que é o início de um novo final que é o início e por aí fora. 

PR - “Threadbare” é o suplemento de alma que estamos a precisar para superar este “novo normal” que estamos a viver? 

Kiko & The Blues Refugees - Threadbare pode ser traduzido por “gasto pelo uso”. Na realidade é um pouco como nos sentimos como músicos cujas carreiras podem ser contadas em décadas. Mas não gastos no sentido de termos ultrapassado o nosso prazo de validade, mas que encerramos em nós multitudes (como diz o Dylan) e que este revelar dos vários filamentos que formam a nossa essência nos torna mais claros nos nossos intentos. O facto de estarmos a viver um processo de redescoberta dos valores da liberdade pelas contingências da pandemia criou um pendor de maior urgência na nossa mensagem, sem intenção de sermos panfletários ou moralistas. Apenas visões de músicos que viveram e vivem várias realidades e que nos tornam mais honestos por não querermos provar nada. 

PR - Este álbum é a prova de que podemos ambicionar a um grande disco de blues e soul feito em Portugal? 

Kiko & The Blues Refugees - Acho que não é necessário o nosso disco para isso, mas se a nossa contribuição for útil que assim seja. O que queremos é que a nossa música possa ter o seu espaço e que a influência que possa ou não ter, seja fruto da escolha do público e isso parte de plataformas de divulgação como o Portugal Rebelde!

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